Se definirmos
zombie como aquele que regressa há vida depois de morto, podemos classificar
Jesus como um Zombie. Extremamente ofensivo, eu sei – mas remeto para o título
do texto… Afinal, nem todos os Zombies são maus!
Depois de
longos anos a estudar em instituições Católicas, enquanto mente naturalmente
céptica e com um acentuado travo de ironia, não consigo parar de me questionar
o que leva alguém a acreditar em Deus. O que leva alguém a crer que o seu
Futuro, o seu Passado e o seu Presente estão dependentes de um acordo tácito
com Jesus - uma personagem histórica que viveu há mais de dois mil anos. Que
morreu pelos nossos pecados – apesar de na prática segundo a doutrina da mui nobre Igreja Católica podermos ir
para o Inferno pelos nossos pecados… Mas bem, confesso que Teologia não é de
todo a minha área, e não pretendo entrar em questões técnicas. A minha questão,
na sua raiz mais básica, é pura e simplesmente o que é que o comum dos mortais
vê de atractivo na crença em detrimento da falta desta. Aquilo que chamamos
vulgarmente de ateísmo apesar de partilhar da opinião que esse é um daqueles
termos que faz alguma confusão. Rotular-me como ateísta é como rotular-me de
não preta, asiática ou praticante de futebol. Não definimos uma pessoa por
aquilo que ela não é.
Ou talvez sim.
Porque a questão de Deus é especial.
O meu primeiro
grande problema com Deus, não é Deus per
se mas o seu clube de fãs. Fascina-me essa comunidade de pessoas que pegam
na Bíblia e levam os seus textos até às últimas consequências… As metáforas
existentes têm valor e não nego que possam ser utilizadas como um modo de
ensinar valores saudáveis às crianças (e até mesmo a alguns adultos) - a raiz da
religião em si não é má, simplesmente não entendo como é que em pleno século
XXI se leva a sério alguém que tem como lei um livro que vai de serpentes
falantes a mulheres criadas das costelas de homens, sem mencionar o meu
preferido: quando o filho do primeiro homem e mulher na terra decide casar vai
à aldeia vizinha (espera, esses vieram da costela de quem mesmo!?).
Os meus
problemas com a claque de Deus não terminam aqui porém. O constante assédio
também me perturba. Ofertas de lugares no céu, venda de Bíblias à porta de casa
e ainda as queridas senhoras em paragens de autocarro que olham para mim com
ares de súplica suspirando como tenho cara de quem precisa de Deus. Preciso é
de paciência! Mas não julgo o todo pela parte ou a parte pelo todo. Sei que nem
todos os Católicos se comportam assim, mas falta uma atitude, uma mudança
daqueles que sabem viver em respeito pelos descrentes…
E depois chegamos
há organização em si. Á Igreja Católica enquanto instituição que prega a
pobreza, a obediência e a castidade num sorriso irónico que revela o antigo
(mas pertinente) ditado “faz o que eu digo, não faças o que eu faço”. A pobreza
pode ser aplicada em alguns casos, mas como o exemplo vai de baixo para cima é
normal que acabe por cair – chama-se gravidade, uma pequenina lei da física –
se calhar está na altura do exemplo vir de lá de cima de quem realmente tem
poder. Mas quem pode censurar o Papa, eu também, acho os sapatos Prada vermelhos
muito mais interessantes que umas simples sandálias de couro…
Outro dos principais motivos que, pessoalmente,
me faz questionar a Igreja é falta de igualdade – uma instituição fundada em
honra de um Homem tão nobre, tão humanitário, tão revolucionário como Cristo, deixou-se
corromper. Perdeu-se. Aquele homem que pregava de terra em terra, que quebrava
as injustiças, sentir-se-ia, provavelmente, envergonhado de ver que o seu nome
é associado a uma organização em que os genitais ainda contam como um atestado
de validade, em que se protege as aparências em vez do que realmente conta – os
valores. Em que a evolução foi estanque porque ninguém, ninguém!, conseguiu
levá-la a crescer porque ceder a pressões é mais fácil do que lutar contra
elas. A Igreja cresceu para se tornar
aquilo contra que Jesus pregava. E mesmo assim os fiéis não conseguem parar e
questionar. E, se o ensinamento mais básico de cristo foi o amor, a acção mais
básica foi questionar os dogmas à sua volta. Com confiança no seu “pai” e
pedindo aos outros que o seguissem, mas não é mesmo Cristo que termina
questionando o seu próprio pai: “Por que me
abandonaste?”.
E no entanto
ignorar é mais fácil. Ser conduzido numa dança de redundâncias é mais fácil do
que sair desse círculo e questionar o que está a acontecer. E esse é o problema
da religião hoje em dia, não só da Católica, mas em geral. Estar integrado numa
religião é fácil. É um facilitismo. Menos inquietações, menos perguntas, menos
noites mal dormidas. E no entanto provavelmente isto não é estar integrado numa
religião, porque estar integrado no que quer que seja implica pensar, implica
passarmos a fazer parte do todo e não, sermos arrastados pelo todo. Não é
ficarmos num estado de dormência tal, que deixamos de pensar, pensar é viver.
Voltando ao título do texto, estes crentes, que nem sabem muito bem naquilo que
crêem tornam-se zombies que se arrastam pelos meandros sombrios de algo que
desconhecem.
E não, estes
crentes, estes zombies, também não são maus. Não entro no jogo idiota de bem versus mal é uma luta caduca e somos
todos humanos, somos todos bons e somos todos maus. Não temos é de ser todos
carneirinhos. Podemos pensar, questionar e crescer dentro ou fora da religião,
com consciência das nossas escolhas e das razões que nos levam a optar.
Há uma coisa que lhe garanto: pensa, sim senhora, e com o corpo todo.
ResponderEliminarParabéns por isso! :)
Simplesmente interessante o teu ponto de vista. Temos tema para tertúlias.
ResponderEliminarUm tio.
Maria Rita, em primeiro lugar, Parabéns pelo titulo (tanto do blog como pelo do texto), irrita-me não ter pensado nele primeiro. Em segundo, este texto foi um dos meus preferidos, do principio ao fim, uma grande escrita com um humor consciente: GENIAL. Continua a escrever e não te esqueças da tua contratação para o Café Curto, neste patamar vamos vender que vai ser uma loucura! PARABÉNS.
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